Artigo*: Não podemos ficar para trás, essa é a hora de fechar acordos
Sueme Mori e Pedro Rodrigues
Nas últimas semanas, voltaram a ocupar espaço na imprensa notícias sobre as negociações do Acordo de Livre Comércio entre Mercosul e União Europeia. Desde o início da negociação, em 1995, houve momentos em que as conversas entre os blocos avançaram, gerando esperança de que um acordo final estava próximo e, em outros períodos, o silêncio imperou. Além da sua relevância do ponto de vista comercial - a União Europeia é o segundo maior parceiro comercial do Brasil - a entrada em vigor deste acordo representará um marco na história brasileira em termos de abertura comercial.
Atualmente, o Brasil conta com uma rede pequena de Acordos Comerciais, colhendo assim poucos benefícios em relação a outros mercados ao redor do mundo. Para efeitos comparativos, os países com os quais o Brasil possui tratados de livre comércio representam apenas 2,6% do PIB global e 12,9% da corrente comercial do País. Enquanto isso, mercados como a Coreia do Sul e o Chile têm acordos com cobertura comercial de 82% e 95,1%, respectivamente.
Os Acordos de Livre Comércio são mecanismos muito efetivos na integração dos países às cadeias globais de valor e na promoção da melhoria do bem-estar econômico das populações. Esses tratados, em geral, possuem caráter bastante abrangente e tratam de regulações importantes relacionadas ao comércio e ao desenvolvimento econômico. Eles exercem influência sobre temas como a redução e eliminação de tarifas de importação, compras governamentais, propriedade intelectual, meio ambiente e regras de origem, melhorando o acesso das partes envolvidas a bens mais baratos e produzidos de maneira mais eficiente.
Assim como o comércio internacional evolui e aumenta sua complexidade, o mesmo acontece com os acordos comerciais. Se antes a negociação sobre tarifas de importação dominava o processo de negociação, hoje questões relacionadas a barreiras técnicas, medidas sanitárias e fitossanitárias e meio ambiente também ocupam papel central nas discussões.
Mesmo com os compromissos de redução das alíquotas de importação assumidos pelos países, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), os acordos comerciais aceleram e proporcionam melhores condições de acesso. Tradicionalmente mais protegido, o setor agropecuário conta com tarifas mais elevadas em relação a outros bens na maior parte dos países. Tomando como exemplo os tratados em negociação pelo Mercosul, as tarifas médias aplicadas sobre produtos agropecuários alcançam 56,8% na Coreia do Sul, 15,9% no Canadá e 11,7% na União Europeia, enquanto para os demais setores este indicador figura em 6,6%, 2,1% e 4,1%, respectivamente. Essas altas tarifas dificultam o acesso a terceiros mercados, visto as margens baixas existentes nos preços dos produtos agropecuários em relação aos bens industriais, o que faz com que mesmo alíquotas baixas sejam, muitas vezes, impeditivas.
É importante lembrar que nem só as tarifas configuram barreiras ao comércio. Entretanto, elas ainda são um grande entrave para a competitividade dos produtos brasileiros. Um exemplo é o café solúvel. Atualmente, o produto brasileiro sofre uma tarifa de 9% para entrar no bloco europeu, enquanto Colômbia e Equador são importados com tarifa zero. De acordo com o que foi negociado entre Mercosul e UE, após quatro anos de entrada em vigor do acordo, o café solúvel brasileiro também será beneficiado com tarifa zero.
Uma boa notícia é que, se usarmos como referência os acordos já negociados por países com os quais o Brasil possui tratativas em aberto, como Coreia do Sul e Canadá, a perspectiva é de que haja ganhos consideráveis em termos de eliminação de tarifas. No caso sul-coreano, por exemplo, as alíquotas médias de importação para produtos agropecuários devem cair em até 95% no acordo já firmado com os Estados Unidos. Há ainda grande abrangência na quantidade de produtos alcançados pela redução nas tarifas de importação. No caso canadense, as negociações com o Peru permitiram que 97% do universo de bens agropecuários tivessem suas alíquotas zeradas já no primeiro ano de acordo.
Esses padrões também são vistos no texto final do acordo negociado pelo Mercosul com a União Europeia, onde mais de 90% dos produtos agropecuários do bloco sul-americano terão as alíquotas de importação eliminadas após dez anos, quando se encerrará o calendário de redução. Apesar dos benefícios e de as negociações já se encontrarem concluídas, o processo de ratificação do acordo Mercosul - UE ainda não foi iniciado porque o bloco europeu deseja incluir no texto final compromissos adicionais dos países sul-americanos no tema meio ambiente. O agro brasileiro sempre foi favorável a esse acordo, porém todos os custos existentes devem ser mensurados e a reciprocidade deve ser o principal pilar para a finalização deste tão longo processo.
A agenda de abertura comercial deve avançar em benefício do desenvolvimento social e econômico do Brasil. Particularmente para o setor agropecuário, que sofre com as altas tarifas de importação, a ampliação da rede de acordos é fundamental para que o País possa exercer plenamente o seu papel protagonista no comércio agropecuário mundial e contribuir, ainda mais, com a segurança alimentar global.
Sueme Mori é diretora de Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Com a colaboração de Pedro Rodrigues, assessor de Relações Internacionais da CNA
*Artigo publicado originalmente na Broadcast