Minas Gerais
Carinho dá mais leite - como a doma de novilhas para ordenha estimula a produção
Por: SENAR MINAS
A rotina é nova, mas é cumprida com rigor pelo vaqueiro. Cerca de vinte dias antes do primeiro parto de cada novilha, Givaldo Macedo começa a preparar o animal para a ordenha. A calma, agora, é a chave do sucesso. Ele a conduz até a sala de ordenha, escova seu pelo e a deixa pronta, com tranquilidade, para as novidades que virão. “Trabalho com ordenha há mais de 15 anos e nunca imaginei como esse preparo ia mudar tanto as coisas. As novilhas já chegam tranquilas, soltam mais leite, sem briga e sem tomar tanto tempo. Já não precisamos mais aplicar ocitocina, o que gerou ainda mais economia, com tantos benefícios”.
A mesma mudança é também festejada em outras propriedades no município de Manga, região Norte de Minas. Por lá, o curso de Doma Racional de Novilhas para Ordenha, promovido pelo Sistema FAEMG/SENAR/INAES, derrubou hábitos antigos e provou que carinho dá mais leite sim!
Pércia Rocha, instrutora do SENAR MINAS e técnica de campo do Programa FIP Paisagens Rurais
A instrutora Pércia Rocha foi quem ensinou aos participantes as técnicas de doma, visando ao bem-estar dos animais. “Um dos desafios enfrentados pelos produtores é executar o manejo racional em animais mais reativos. Muitas vezes, a ordenha torna-se bastante difícil e há, inclusive, prejuízos na produção leiteira e maior gasto de tempo e de energia do produtor neste processo. Tivemos relatos de produtores que estão na atividade há mais de 30 anos e que ainda não sabiam que era possível, fácil e muito proveitoso domar os seus animais”.
É o caso do Gilson Fraga. Em mais de três décadas na pecuária leiteira, ele nunca pensou que simples mudanças de comportamento poderiam proporcionar resultados tão rápidos. “Com o preço da ração lá no alto e o litro do leite lá embaixo, conseguir produzir mais e gastando menos faz toda a diferença. Trabalhar com animais mais tranquilos é muito melhor e a gente ganha até em tempo. Nossa forma de tratar os animais mudou demais. Fazemos as coisas com calma e o animal sem stress dá muito mais leite. Todo produtor deveria receber esse treinamento. A gente só tem a ganhar em tudo o que o SENAR nos traz”.
O treinamento foi solicitado pelo técnico de campo Carlos César Rodrigues dos Santos ao mobilizador Ednaldo Neves Saraiva, ao perceber a necessidade dos produtores atendidos pelo Programa Especial AgroNordeste, dentro do projeto Leite Saudável. “Via a dificuldade dos produtores em iniciar os animais na ordenha, manual ou mecânica, com risco frequente de acidentes. Muitas vezes, o animal passava por todo o período de lactação sem se acostumar com o manejo, sem alcançar o potencial de produção que poderia ter se não estivesse estressado. Fiquei muito contente com os resultados nas propriedades que já solicitei mais duas turmas de doma para treinarmos todos os produtores que atendo”.
A especialista explica!
“As novilhas muitas vezes têm dificuldade para entrar na linha de ordenha porque tudo é muito novo para elas. Acabaram de parir pela primeira vez, e a primeira ordenha é uma situação estranha e assustadora. Na pressa da lida, muitas vezes o tratador fica nervoso e tenta fazer na marra.
Quando o animal fica estressado, libera o hormônio cortisol e adrenalina, que inibem hormônios importantes à lactação, como a ocitocina. Isso atrasa o ‘descer’ do leite. E gera custos, desde a necessidade de aplicação da ocitocina injetável até outras dificuldades do manejo que podem ser prejudiciais às instalações e machucar animal ou o produtor. Há, inevitavelmente, uma perda de produção.
Treinamos, então, esses vaqueiros para uma interação humano-animal, para começarem a preparar as novilhas ainda no pré-parto para estarem habituadas a esse cuidador, ao novo ambiente e às práticas que virão.
Dar ao animal o que precisa para viver bem e com tranquilidade gera sempre um retorno muito positivo. Carinho dá leite”.
Território deles ou delas?
Durante a dinâmica de encerramento do curso de Doma Racional para Novilhas, a instrutora Pércia foi homenageada pelos participantes. “Eles confessaram que, quando se inscreveram, imaginaram um professor do sexo masculino, e foram surpreendidos por uma moça. Que era de tirar o chapéu uma moça indo de longe, ter em mãos uma técnica que eles não conheciam e ter domínio sobre aquele grupo de homens presentes naquele lugar”.
Zootecnista e mestre em Ciências Veterinárias e Comportamento Animal, Pércia destaca que a presença feminina nas atividades técnicas rurais ainda é incipiente, mas tem sido muito respeitada e tem grande espaço para crescimento. “A doma é território do afeto. Há uma associação equivocada de vencer o animal pela força, quando deve ser com bem-estar e carinho. Não é uma exclusividade feminina, mas naturalmente a mulher tem essa sensibilidade mais aflorada. Tanto que há, hoje, grande procura por mulheres para a ordenha, porque as pesquisas científicas já comprovam que o animal responde ao trato tranquilo com aumento de produção. E muitos homens também já entendem isso e estão mudando a forma como sempre trabalharam”.