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22 de novembro de 2016
Conectividade redesenha a geografia global
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POR CNA

"Geografia é destino". Até bem pouco tempo atrás esta frase dominava as discussões e teorias sobre geopolítica. Deriva da ideia determinista de que certas regiões geográficas têm vantagens estratégicas, econômicas e políticas, que são críticas para controlar a ordem mundial. Esta lógica consolidou, por muito tempo, a crença de que muitas nações são prisioneiras de sua posição geográfica e nunca terão acesso aos mercados e às novas tecnologias de que precisam para florescer na economia global.

Mas, agora é substituída pela ideia de que "a conectividade – e não a geografia – é o nosso destino". Tal tese é defendida pelo jovem e celebrado estrategista Para Khanna, do Centro de Globalização da Universidade Nacional de Cingapura, em seu livro ‘Conectografia: mapeando o futuro da civilização global'. A obra apresenta a conectividade como a grande força revolucionária do século XXI, e a melhor maneira de aproveitar ao máximo qualquer geografia, promovendo ligações e sinergias, como fazem, por exemplo, Cingapura e Dubai.

De acordo com Khana, a conectividade, viabilizada por tecnologias e infraestrutura de transporte e comunicações e por relações de comércio, é agora parte determinante da nossa amarração com a geografia. Para unir cada vez mais seus povos, culturas e mercados, países e empresas investem somas astronômicas interligando as maiores cidades globais umas às outras. "Isto gera consequências profundas para a geopolítica, a economia, a demografia, o meio ambiente e a identidade social", diz o autor.

Os números que sustentam a tese de Khanna são sólidos. Segundo ele, a rede de infraestrutura que interliga o mundo está em grande expansão e já conta com 64 milhões de quilômetros de rodovias, quatro milhões de quilômetros de vias férreas, dois milhões de quilômetros de grandes dutos, um milhão de quilômetros de cabos de Internet, sem falar na intrincada rede de vias aéreas e marítimas que cortam o mundo em todas as direções. As fronteiras internacionais, definidoras da geografia convencional, somam menos de 500 mil quilômetros.

Esses números indicam que a conectividade é, cada vez mais, uma parte determinante de nossa ligação com a geografia e isso terá grande impacto no futuro da humanidade. A civilização de redes globais que está emergindo promete dinamizar as cadeias de fornecimento, reduzir a desigualdade, e até mesmo superar rivalidades geográficas. Incluindo desestímulo a guerras e conflitos, que quase sempre destroem a infraestrutura, o que é péssimo negócio para todos.

Outra dimensão importante da ‘conectografia' é o emergente padrão de poder global, impactado por uma nova ordem de empreendedorismo e negócios. Empresas jovens como Apple, Amazon, Alphabet, Uber, Airbnb e Facebook se beneficiam da infraestrutura globalizada para prover serviços inovadores, respondendo com grande eficiência às necessidades de uma população cada vez mais urbanizada, dependente de tecnologia e influenciada pelo dinamismo que a conectividade global cria. A rápida emergência dessas empresas indica claramente que a capacidade de integrar mercados, se aliar aos melhores parceiros e unir pessoas é que irá moldar a força econômica no futuro.

Por mais que essas ideias possam ser contestadas, face a conflitos de domínio territorial e de migrações, ora presentes, é importante que tal visão seja analisada na perspectiva da trajetória que a humanidade deverá trilhar em prazos mais longos. Liderar com conectividade poderá distinguir países, organizações e negócios, tendo em vista os benefícios óbvios da criação de ambientes de troca de informações e de criação conjunta na era da informação e do conhecimento em que vivemos.

Que inspiração a ´conectografia´ poderá oferecer ao Brasil, gigante na geografia e na economia? Além da diversidade étnica de mais de 202 milhões de habitantes, o Brasil é feito de múltiplos recortes: seis biomas, cinco regiões, 27 estados, dezenas de metrópoles e 5.570 municípios que se espalham pela imensidão de 8.514.876 km². ´Conectografia´ é um conceito que poderá marcar o futuro de países grandes, complexos e plurais como o Brasil. Enquanto os recortes geográficos são úteis e nos ajudam a compreender e transformar espaços complexos, atenção excessiva a essas divisões limitam visões mais ousadas de futuro para um país inserido em contextos cada vez mais dinâmicos e desafiadores.

A Embrapa vem utilizando o conceito de Inteligência Territorial Estratégica para organizar e interpretar as abundantes informações sobre os quadros natural, agrário, agrícola, socieconômico e de infraestrutura do Brasil, e alimentar o planejamento integrado e a conectividade para melhor aproveitamento das funcionalidades de nossa privilegiada geografia. Se bem aplicado, o conceito de Inteligência Territorial Estratégica tem o potencial de ajudar o Brasil a criar boas políticas públicas para crescer mais ordenado e harmônico e se inserir, de forma mais competitiva, nas grandes redes de interação, comércio e cooperação que o futuro da ‘conectografia' promete.

*Maurício Antônio Lopes é presidente da Embrapa