ALIMEN T AN D O O B R A SILEIRO

Publicações

Artigo Técnico
14 de junho de 2018
Paralisação pressiona preços dos alimentos
banner.png
POR CNA

Autores: Carolina Nakamura
                Paulo André Camuri

Promotor: Superintendência Técnica da CNA

Assunto: Paralisação pressiona preços dos alimentos

PRINCIPAIS RESULTADOS

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de maio/2018, divulgado dia 08/06 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foi de 0,40%. Em abril, o indicador havia apresentado alta de 0,22%.

O mercado esperava um aumento menor no indicador em maio. A Pesquisa de Projeções Broadcast junto a 46 instituições financeiras, divulgada ontem, indicava alta entre 0,20% e 0,64%, com mediana de 0,30%. O IPCA acumulado entre junho de 2017 e maio de 2018 também registrou 2,85% e foi maior que a estimativa (+2,75%, mediana do mercado), sendo que as projeções variavam de 2,64% a 3,10%. Apesar dessa aceleração no mês de maio, a projeção do IPCA para o 2018 está em 3,65%, segundo Boletim Focus do Banco Central de 01 de junho de 2018, abaixo da meta do governo de 4,5%.

Os alimentos passaram de +0,09% em abril para +0,32% em maio. O seu impacto no IPCA geral foi de 0,08 p.p.. Os alimentos consumidos em domicilio aceleraram 0,36% e alimentação fora de domicilio registrou alta de 0,26%. Nos últimos 12 meses, enquanto o IPCA registra alta de 2,85%, os alimentos registram queda de -1,45% sendo puxado pela alimentação em domicilio que apresenta retração -3,80%. É nesse subgrupo que se encontram os produtos agropecuários.

Os produtos alimentares cujos preços tiveram as variações mais importantes estão indicados no Quadro 1 a seguir.

Quadro 1- Alimentos com destaque no IPCA de Maio de 2018

Como indicado no Quadro 1, a elevação mais expressiva de preços foi da cebola (+32,36%) devido à redução da oferta nos mercados distribuidores, que foi consequência do termino da safra da região Sul do Brasil, onde são produzidas grande parte da cebola comercializada no país. Outro fator que contribuiu para a alta dos preços em maio, foi a redução da produtividade das áreas de produção do Nordeste ocasionada por fatores climáticos. É importante ressaltar que a safra do Nordeste se inicia na fase final de colheita da safra da região Sul.

Outro produto que teve alta de preço e que merece destaque foi a batata (+17,51%). O aumento dos preços da batata pode ser justificado por dois fatores: na primeira metade do mês de maio foi caracterizada pela baixa oferta da batata padrão ágata especial. Esta baixa oferta nos mercados se deve à redução dos volumes colhidos por causa de problemas climáticos ocorridos durante a safra das águas (safra de verão). Já na última semana do mês de maio, as cotações da batata padrão especial subiram muito devido à paralisação dos caminhoneiros. Os impactos da paralisação dos caminhoneiros em relação aos alimentos serão descritos com mais detalhes abaixo.

As hortaliças (+4,15%), de uma forma geral, registraram uma pequena alta nos preços no mês de maio devido à baixa oferta de alguns dos principais produtos comercializados. Esta baixa oferta foi ocasionada por adversidades climáticas, entressafra de alguns produtos e, na última semana do mês, pela paralisação dos caminhoneiros. 

No caso do leite, a alta em maio de +2,65% no preço do leite UHT é reflexo do movimento de alta dos preços pagos ao produtor verificado desde janeiro/2018. A alta oferta, e consequente baixa das cotações do leite no final de 2017, levou a uma desaceleração na captação de leite no início de 2018 influenciada também pela menor margem obtida na atividade por parte dos produtores. A baixa captação de leite, antecipou a alta de preços do produto que usualmente ocorre apenas a partir do segundo trimestre. Importante destacar que essa alta de preços do leite em maio, ainda não reflete os impactos da greve dos caminhoneiros.

Quanto aos produtos que tiveram queda de preços, a redução mais expressiva de preço foi do açúcar cristal (-3,32%), que vem em uma tendência de queda, devido ao aumento da produção de açúcar em outros países e regiões como Índia, Tailândia e União Europeia, o que gerou um superávit, em torno de 10 milhões de toneladas, na safra mundial 2017/2018 de açúcar. No mercado interno o clima seco favorece a colheita no Centro Sul do país, que já colheu 36% a mais se comparado com a safra passada, e, consequentemente, aumentou a oferta de cana-de-açúcar e seus produtos.

O preço do café moído também apresentou queda (-2,28%). Isso pode ser explicado pois esse é um ano de bienalidade positiva, ou seja, com uma produção superior a do ano anterior. Essa produção será de aproximadamente 58 milhões de sacas. Com isso, o aumento na oferta causa uma redução do preço pago ao produtor e, consequentemente, ao consumidor. Porém, esse repasse é perdido ao longo da cadeia produtiva, chegando uma redução mínima ao consumidor. A redução mais intensa nesse mês em relação ao anterior (-0,36% em abril), é reflexo do avanço da colheita. Possivelmente, se não houver nenhum fato novo, essa redução será ainda maior no próximo mês. A colheita ocorre de abril a agosto, sendo mais intensa nos meses de junho e julho.

Em relação às frutas, os preços apresentaram uma retração -2,08% no mês de maio. Essa redução se justifica pelo maior volume de algumas frutas ofertadas durante grande parte do mês de maio. Alguns produtores relataram que frutas como a banana, por exemplo, que está na lista das mais comercializadas, chegou a registrar altas reduções de preço alguns centros de comercialização no mês de maio. O preço mamão apresentou queda de -16,53% devido ao período de colheita em regiões como norte do Espírito Santo e no extremo sul da Bahia, que aumentou volume de produto no mercado.

As carnes também apresentaram queda média de -0,38% em seus preços. Onze dentre quinze cortes (que representam 70% da carne bovina) tiveram quedas de preço entre -0,16% e             -1,25%. A carne de porco (que representa 8% do subgrupo de carnes) também ficou -1,03% mais barato. A proximidade do período de entressafra de pasto ampliou a oferta de bois para abate o que, aliada ao fechamento abrupto de mercados externos de carne bovina e de frango, ampliaram a oferta doméstica e pressionou os preços de ambos os produtos considerados substitutos entre si.

As aves e ovos sofreram queda conjunta de -1,13% nos preços ao consumidor em maio, sendo de -0,99% no frango inteiro, -0,97% no frango em pedaços e de -1,62% nos ovos. Os preços da carne de frango, que apresentavam quedas sucessivas desde o início do ano, reagiram à desorganização em função da greve e assumiram tendência de alta, principalmente no atacado. Vale destacar, entretanto, que as elevações de preço no varejo, a serem captadas quando da divulgação do IPCA de junho, refletirão também a baixa base comparativa de preços até então vigente.

O IMPACTO DA GREVE DOS CAMINHONEIROS NOS PREÇOS DOS ALIMENTOS EM MAIO

Os últimos 10 dias do mês de maio foram marcados pela greve dos caminhoneiros que provocou um significativo desabastecimento de produtos essenciais, como alimentos, remédios e combustíveis, resultando em perdas acima de R$7 bilhões no faturamento da agropecuária brasileira. Esse estrangulamento na oferta levou a uma reversão nos preços dos produtos agropecuários, que desde o início de 2018 vinham surpreendendo positivamente e garantindo inflação inclusive abaixo da meta.

Os dados de inflação disponíveis até o momento corroboram esse impacto adverso da greve dos caminhoneiros nos preços dos alimentos in natura e perecíveis. Isso pode ser percebido através da leitura conjunta de diversos indicadores que, por diferenças metodológicas, trazem informações complementares entre si.

Os três índices de preços aqui referidos – IPCA, IPC-S e IPA Agropecuário - apontam que houve significativo aumento de preços aos consumidores, particularmente de alimentos – derivado da greve dos caminhoneiros.

Por que consultar diferentes índices de preços?

Os índices de preços apresentam a variação média de preços de listas de produtos de interesse de diferentes públicos-alvo. Aqui são apontados 3 índices, dois deles relativos a preços no varejo -  Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) – e outro relativo às cotações vigentes nas regiões de produção.

IPCA e IPCA-15: variação média de preços de uma lista de produtos demandados por famílias com renda entre 1 e 40 salários mínimos. Os levantamentos ocorrem, respectivamente, ao longo de todo o mês, e entre o 16º do mês anterior e o 15º do mês de referência. Por considerar os últimos 10 dias de maio, o resultado do IPCA revela a mudança na dinâmica de preços, comparativamente ao período antes da greve expresso no IPCA-15.

IPC-S: apesar da coleta ser semanal, o índice apura a variação de preços nas últimas 4 semanas antes da divulgação do índice. A lista de produtos e serviços com preços acompanhados abrange diferente setores. A comparação entre os IPC-S de 07/Junho e de 31/Maio revela que os preços ao consumidor seguiram acelerando mesmo encerrada a greve.

IPA Agropecuário: variação média das cotações vigentes nas regiões produtoras de produtos agropecuários. As cotações de preço revelam, essencialmente, o preço ao qual tanto o demandante “fora da porteira” como o produtor rural expressam concordância em realizar a transação comercial sem que haja, entretanto, garantia de entrega. Na greve, diante da incapacidade de efetivar a entrega (ou busca) do produto, os preços (e sua variação) captados no IPA Agropecuário revelam apenas uma predisposição à transação comercial aquele preço e não um valor, de fato recebido pelo produtor rural, pela venda de sua produção.

 


Os preços ao consumidor intensificaram a alta de 0,22% em abril, para 0,40% em maio (conforme o IPCA global); e de 0,24% para 0,83%, nas últimas 4 semanas encerradas, respectivamente, em 31/Maio e em 07/Junho (conforme o IPC-S). Especificamente os preços de “alimentos e bebidas” e de “alimentos no domicílio” subiram, respectivamente, 0,32% e 0,36% com a greve. Antes dela, os primeiros caiam 0,05%, enquanto os segundos subiram modestos 0,09%, conforme indicado no gráfico 1 acima. Similarmente, nas regiões de produção agropecuária - principalmente de hortaliças, legumes, frutas e carnes bovinas - as cotações subiram, em média, de 0,98% entre 21/Abril e 20/Maio, para 1,5% entre 01 e 31/Maio (IPA-Agropecuário).

Na verdade, o que se verificou foi que tanto consumidores como produtores rurais perderam com a greve. Enquanto os primeiros viram-se diante de preços mais elevados e falta de produtos, os segundos (produtores rurais) perderam renda diante de mercados, em parte ou completamente, travados e pela impossibilidade de escoar insumos e de produtos. Conforme indicado a seguir, para alguns produtos as perdas – e as altas de preços – não ficaram restritas ao período da greve e continuam a ser observados também em junho.

PRODUTOS AFETADOS

Batata

Durante a greve dos caminhoneiros, a batata atingiu preços recordes no varejo. No entanto, o produtor não se beneficiou dessa alta, pelo contrario, teve prejuízo. Isso porque no inicio da greve ele já havia embarcado sua mercadoria a um preço baixo e, durante a greve, quando o preço estava alto, por não ter como escoar sua mercadoria, não a vendeu.

É importante ressaltar que preço da batata foi se elevando gradativamente durante a greve. Com os caminhões parados, as mercadorias precisaram ser descartas. Dessa forma, os centros urbanos ficaram desabastecidos. Os produtores, diante da impossibilidade de transporte e em um esforço de minimizar as perdas, venderam suas mercadorias a preços muito baixos. Parte significativa da produção, porém, foi perdida ainda dentro das propriedades.

Leite

O preço recebido pelo produtor de leite depende do mercado de leite UHT e de seus derivados, algo que em maio já estava precificado quando da ocorrência da greve. Esta, ao impossibilitar o escoamento da produção do campo, derrubou as cotações e, consequentemente, a renda do produtor. Diante da impossibilidade de coleta muitos produtores descartaram o leite ou receberam valores muito abaixo de seus custos de produção.

Apesar disso, uma vez cessado o movimento grevista coube à indústria e aos varejistas repor estoques, respectivamente de leite e de seus derivados. Esse replanejamento da demanda por parte da indústria, tem pressionado o mercado (e os preços) do leite cru, algo a ser captado no indicador de inflação (IPCA) apenas em junho.

Além desse aumento de demanda por leite cru, a captação (oferta) de leite foi reduzida significativamente também depois da greve. As dificuldades logísticas durante a paralisação levaram à imposição de restrição alimentar às vacas de diversas propriedades. Além disso, muito animais que se encontravam em estágio avançado de lactação, mais de 200 dias pós parida, acabaram sendo secas, ou seja, tais vacas foram excluídas da produção. Por questões fisiológicas dos animais, mesmo com a posterior normalização da rotina alimentar, tais animais só voltarão a expressar seus potenciais produtivos na próxima lactação.

Assim, em linhas gerais, embora durante a greve as cotações do leite tenham despencado, as consequências de médio prazo na cadeia produtiva têm levado a altas nos preços dos produtos lácteos. Ainda assim, as margens “dentro da porteira” tendem a ser menores diante das perdas de capacidade produtiva na atual lactação, apesar dos preços maiores pagos pela indústria.

Carne bovina

O impacto da greve no mercado de carne bovina foi distinto no varejo e no comércio de boi gordo. Este último, mesmo antes da greve dos caminhoneiros, já vinha apresentando cotações estáveis com tendência de queda, pressionado pela alta oferta de animais diante da perda iminente de capacidade de sustentação de pasto com chegada do inverno. A greve piorou esse quadro ao reduzir a janela de venda do boi gordo impondo uma pressão de queda nas cotações do animal.

Por outro lado, ainda que momentâneo, o desabastecimento do varejo permitiu à indústria beneficiar do aumento de margem líquida diante de custos menores (do boi para abate) e receitas maiores (de alguns cortes) no varejo, em que pese os prejuízos com perdas de vendas nos mercados doméstico como externo.

Suínos, Aves e Ovos

A natureza dos impactos da greve dos caminhoneiros foi similar na produção de carne de aves e de suínos. Isso porque a produção dessas carnes contempla elevada participação de propriedade integradas que, diante das dificuldades logísticas, tiveram dificuldades de abastecimento de ração e de envio dos animais já terminados para abate nos frigoríficos. 

A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) noticiou a morte de 70 milhões de aves, dentre animais adultos e pintainhos. Encerrada a greve, os desdobramentos na produção de frango continuam diante do menor alojamento de pintainhos e da perda na produtividade dos animais que passaram por restrição alimentar durante a greve.

A dificuldade de reabastecimento dos frigoríficos, aliada aos ainda baixos estoques do setor atacadista têm pressionado os preços da carne de frango no atacado que, gradativamente têm chegado também ao varejo, particularmente a partir da primeira semana de junho.

No caso dos suínos, as dificuldades pós greve são semelhantes às encontradas na produção de carne de aves. Os descompassos gerados pela greve estendem-se ao longo das fases do animal. Em algumas regiões, por exemplo, leitões que deveriam sair da creche com, no máximo, 23Kg estão chegando às propriedades, para crescimento, com 30kg exigindo ajustes no planejamento produtivo também das fábricas e do calendário de entrega das rações. Na outra ponta, após a greve, suínos terminados passaram a sair para abate com até 40kg a mais que o usual, o que implica em perdas de conversão (ração/carne) aos produtores, além de fugir dos padrões de acabamento e tamanho dos cortes exigidos pelos diferentes mercados consumidores.

Por fim, a produção de ovos também foi muito impactada com a greve dos caminhoneiros. Além do elevado descarte de ovos diante da impossibilidade de escoamento durante a paralisação, a elevada perda de poedeiras tem afetado a produção. Se por um lado, a oferta ainda esteja sendo afetada mesmo após o fim da greve, por outro a demanda está aquecida diante da necessidade de reposição dos estoques das redes varejistas que ficaram desabastecidas durante o movimento.

Para se ter uma ideia da dinâmica dos preços dos alimentos no varejo, em Bastos (SP), a caixa com 30 dúzias de ovos subiu 23% apenas na primeira semana de junho, revertendo uma tendência de preços mais baixos desde o fim da quaresma. Segundo dados do CEPEA/Esalq, no Estado de São Paulo entre os dias 1 e 12 de junho, a elevação de preços foi de 44,5% para o frango congelado e de 27,7% para carcaça especial de carne suína. 

Com todas as perdas financeiras nessas criações derivadas da greve, é provável que a estrutura de custo pressione também os preços desses produtos para os consumidores, o que deve constar dos indicadores de preços referentes a junho.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os índices de preço divulgados no início de junho revelam aumento de preço dos alimentos. Em geral os dados mostram que os impactos da greve não ficaram restritos apenas aos 10 dias da paralisação, tendo inclusive se intensificado na primeira semana de junho. As análises de comportamento de preços de algumas das principais culturas e atividades agropecuárias revelam ainda que os índices de preço de junho tendem a expressar de forma mais proeminente tais impactos.

Embora o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA Agropecuário) revele que as cotações nas regiões produtoras tenham se elevado substancialmente nesse período, os produtores não se beneficiaram desse aumento de preço. Com os entraves logísticos, muitos mercados ficaram travados reduzindo fortemente a renda dos produtores rurais.

Já no início de junho, os preços de muitos alimentos assumiram trajetórias ascendentes prejudicando os consumidores sem, mais uma vez, beneficiar os produtores rurais. Os custos de produção foram elevados em função da greve e agravados com o tabelamento do frete, que provocou forte alta nos preços dos insumos e tem feito com que produtores retenham a produção enquanto não se chegue a um consenso sobre constitucionalidade da tabela.

Áreas de atuação